É uma simples coincidência. Mas são justamente as coincidências que nos fazem prestar atenção nos detalhes.
Esta semana, a cinéfila escreveu sobre um filme interessantíssimo chamado The weather man, que conta a história de um sujeito que trabalha na TV como – adivinhou? – o homem da previsão do tempo. Boa parte do que acontece no filme (inclusive a cena que mais me fez rir) está relacionado à profissão dele. Mas o post da cinéfila não começa falando do filme e sim do nome que ele recebeu no Brasil. “O homem do tempo” seria pouco para a criatividade e veia poética dos batizadores de filmes tupiniquins, por isso o filme virou “O sol de cada manhã“.
A coincidência é que esta semana revi um filme que tem um nome óbvio, mas que também não resistiu a esta sanha besteirolesca: Rope, um dos melhores filmes de Alfred Hitchcock. Rope foi lançado como Corda ou A Corda em países como Argentina, França, Suécia, Finlândia e Bélgica. Em Portugal chamou-se A Corda. [*]
Para ficar claro: a primeira cena mostra um jovem sendo asfixiado por dois amigos com uma corda amarrada no pescoço: você testemunha o crime, testemunha a ocultação do cadáver (em um baú na sala de visitas). A corda, instrumento do crime, surge diversas vezes durante a trama. Nada mais justo que o filme tenha este nome.
Mas não para o batizador de películas que mora aqui: Rope virou Festim Diabólico. Não sei se na época se chamava jantar de festim, mas em momento algum aparecem personagens com chifre e cauda pontuda. Aliás Hitchcock é vítima tradicional destes título. Vertigo, que trata de – surpresa – vertigem, virou Um corpo que cai – uma referência ao que acontece no final do filme. Strangers on a train, que fala de – evidente – dois estranhos que se encontram numa viagem de trem – virou aqui Pacto Sinistro. Family plot, Intriga em Família em Portugal, por sua vez, virou Trama Macabra – que homenageei no título deste post.
Rope é muito comentado porque Hitchcock usou o menor número possível de cortes, com cenas contínuas de mais de 10 minutos com a câmera seguindo os atores – era esta a capacidade do rolo. [**] Mas o maior mérito do filme está na trama original – sabemos tudo sobre o crime, sobre os criminosos, sabemos onde está o cadáver, o que nos deixa embarcar na situação que contrapõe um assassino orgulhoso de ter cometido o crime perfeito e o criminoso conflitado (uma excelente interpretação de Farley Granger). Um filme para rever.